terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Mosaico


Quantas células foram destruídas para formar as minhas...
Quantos corpos decompostos para compor o meu...
Queria saber se amou, se foi feliz, como viveu uma das milhões de pessoas que me concederam genes que hoje determinam a cor dos meus cabelos.
Meu corpo, um mosaico.
Milhões de seres, milhões de sonhos, de sorrisos desfeitos, de amores interrompidos, de sangues derramados.
Isso me angustia... Este corpo não é meu! Não queria matar para me formar.
Olho para uma pinta que tenho no dedo... Quantas pessoas morreram para formá-la... Olho para meu corpo... Cada detalhe, cada curva; toco no que não é meu.
Perdoem-me por existir. Acreditem; obrigaram-me. Nunca quis esta vida! Nunca quis rouba-lhes o amor, a dor e a infelicidade.
Pagarei por isto; meu sorriso, meus sonhos, meus amores, meus quereres também serão destruídos de forma brutal.
Mesmo que meu ventre não frutifique – darei luz.
Queria saber o que irei determinar aos seres que irão descender de mim. Um pigmento? Um traço? Um cheiro? Um gesto? Ou serei sedimento nas águas?...
Fico a imaginar...
A contemplar a beleza da flor, os detalhes e a maciez de suas pétalas...
Meus longos fios misturados a terra... Até quando? Até quando servirei para alimentar/criar?
Queria encontrar os milhões que existem em mim.
Queria que me contassem suas histórias, sua infância e como foi à chegada até a mim.
Queria que me transformassem em um gerimum – Não me perguntaram, não queria que me formassem!

Agora, quero meu amor! Quero minha família! Quero minha vida! Mas não irei tê-los, ninguém tem, por que irei tê-los?
Os próximos seres já me chamam...
Eles fazem meus dias passarem depressa... Para me extinguir e passarem a existir; a se deliciar e chorar.
Se eu pudesse escolher não lhes daria este sofrer, mas talvez este seja o prazer. 
Inevitavelmente, deixarei minha contribuição... 
Determinarei uma marca de expressão, a lisura ou ondulação de um fio, o pigmento de uma pele, a cor de uma flor, o cheiro de uma rosa, a fraqueza que fará uma maçã despencar afastando-se de seu galho... Ou, ser a força na pata de um leão que determinará novos mosaicos...


Sou milhões, me tornarei milhões.
                                    

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Escuridão

Tudo escuro,
Tudo negro,
Tudo vazio.
Eu estava lá...
De joelhos a chorar,
Na dimensão da escuridão.
A luz da vida apagou-se em mim.
Os raios de luz que formam uma alma, escureceram...
Difícil enxergar escuridão
Quando se quer enxergar as flores.
Difícil é enxergar o não enxergável.
De joelhos estava... cabisbaixa.
Como o único ser, o abandonado ser do infinito.
O infinito teria fim diante da imensidão da escuridão.
Não conseguia enxergar minha existência.
Obscura existência.
Só a dor...
Só ela, só ela existia.
Ela retirou e me mostrou existência.
Não sabia o que era, onde estava.
Pois não era, nem estava.
Apenas sentia...
Apenas sentia a inexistência que a escuridão proporciona.
Como existir sem enxergar a existência?
Restava-me ficar ali, daquele jeito...
Quietinha... Para não despencar no precipício oferecido pela escuridão.
Até que o anjo aparecesse...
Para com sua luz incandescente
Dar luz a existência escondida
Na escuridão...

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Nunca, nunca?




Nunca, nunca mais direi nunca!
Maldita afirmativa que quebra a própria promessa...
Todos meus paradigmas foram quebrados quando fitei seu olhar.
Hoje, inspiro todas as maldições expelidas de meus pulmões.
Todas, todas as palavras malditas, todos os termos de baixo calão, os aceito!
Voltou para mim tudo que desejei tudo que maldisse.
Quando o vi, fitei o desejo em ti que ardia em mim,
Vi em ti uma futura versão de um amor irrealizado.
E nunca mais o esqueci.
Quanto me pesa esta palavra nunca.
Só Deus, só ele sabe as vezes que a razão quis falar-me ao ouvido, mas o desejo, a volúpia, a ânsia, o querer, ensurdeceram-me.
O que fazer quando se quer um querer proibido?
O que fazer quando se deseja algo alheio, mas que lhe pertence?
O que fazer?
O que dizer além do que quer ser dito?
Não paro de pensar em ti...
Nossa pele, nosso cheiro, nosso olhar...
Queria de mãos dadas gritar contigo; dizer ao universo o que somos juntos.
Perguntar ao universo por que nos deste este querer tão puro, mas tão ilícito?
Além de mim, queria dar-lhe a mão.
Enquanto isso...
Estou aqui, você aí... e nossos corpos a se encontrar, nossos olhos a se fechar, nossas bocas a se amar...
Abrirei minha janela para que daí sejas contemplado com o cheiro da minha alma.
Não queres minha alma?
Então chegues a janela, inspire...
O universo encarregou-se de leva-me a ti.
Chegarei invisivelmente, até possuir todo seu corpo...
Quero que se dane! Que se dane o mundo e todas as razões construídas!
Que mal há em amar?
Que mal há em desejar?
Que mal há em ter tudo aquilo que se quer?
Pecar, quem pecou foi quem nos deu esse maldito, bendito sentimento.
Não queremos ser condenados.
Somos malditos inocentes; pecadores inconseqüentes lançados pelo nosso fervor ao calor do submundo.
Te pedirei, te peço tudo! Tudo aquilo que não conseguirei fazer e tudo aquilo que sei que não conseguirás fazer.
Só queria...
Queria que o mundo se calasse... e... de mansinho... quietinha... deitar-me ao teu peito para me abraçar, para nos cheirar... e de olhos fechados nos calar... sem pensar no amanhã: se ele nos dará a vida ou se ele nos dará a morte para a vida.